terça-feira, 19 de maio de 2009

Carta para Silvestre

Eu soube por meio de uma mensagem telefônica, meu caro amigo, que você tinha passado desta para uma melhor. Fiquei surpreso e triste, e quis não acreditar naquilo. Imediatamente, acessei os portais de notícia da Paraíba, e verifiquei que não havia outra notícia na manchete a não ser: “Morre em Recife Silvestre Almeida, ex-Secretário de Estado”. Naquele instante, não tive nada a fazer a não ser chorar pelo seu desencantamento. E chorei sozinho um adeus engasgado e silencioso.

Evidentemente essa tristeza é mais por mim, é mais pelos que ficaram, do que realmente por você. É que ter saudades é como encontrar um retrato de um tempo feliz e se sentir melancólico, simplesmente porque aquela felicidade nunca mais poderá se repetir. Foram mais de dois anos de luta contra uma enfermidade cujo nome antigamente não era sequer pronunciado. Agora você se libertou da doença, do corpo e do mundo, e pode trilhar outros caminhos talvez mais amenos.

A imprensa noticiou a sua trajetória por diversos cargos importantes. Com efeito, você foi gerente de um banco público, diretor-executivo de uma grande empresa, secretária da prefeitura de Campina Grande e secretário do Governo do Estado da Paraíba. Confesso, contudo, que esse Silvestre eu nunca conheci e nunca quis conhecer. Minha convivência era com o compositor, o instrumentista, o poeta, o crítico de artes e o admirador de Mahatma Gandhi e de Martin Luther King. A propósito, ainda hoje escuto e guardo com carinho o “Geografonauta”, o CD com suas próprias canções que você me presenteou.

Minha convivência era com o pai dos meus amigos André, Rodrigo e Sérgio, advogados brilhantes em Campina Grande, tendo você também se tornado logo um bom amigo. Há um pequeno capítulo de nossas vidas que eu me esqueci de lhe contar, e gostaria de fazê-lo agora. Quando lancei o livro “Cemitério de deuses” (Recife: Companhia Pacífica, 1998) eu contei integralmente com o seu apoio, inclusive na condição de um dos revisores. No fundo, você sempre achou que eu fosse um poeta de verdade, e que deveria abraçar esse caminho - um lêdo e ivo engano, sem dúvida. Pois bem, nesse livro havia um poema intitulado “Rascunho” que eu tinha dedicado a você. Ocorre que na rodagem não saiu qualquer dedicatória e eu, que já tinha sofrido com mais de um ano de atraso da quixotesca editora de Jadson Bezerra, optei por não mandar refazer o trabalho. Por conta disso, sempre me achei em débito com você, embora tal fato nunca tivesse chegado ao seu conhecimento.

Se pudesse voltar no tempo, eu teria atrasado em mais um ano a publicação do livro, mas não teria aberto mão da dedicatória do poema. Se pudesse realmente voltar no tempo, eu teria conversado mais com você, jogado mais futebol, conversado mais sobre poesia e música, ouvido mais você tocar aquele violão de doze cordas. Mas o tempo é um relógio ingrato e misterioso, e eu sei que nada disso mais será possível. Como o presente é somente o que existe, eu me despeço com tudo o que posso guardar de você: boas lembranças, carinho, saudade e um desejo de bem-aventurança. Adeus...

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