Essa interessante crônica de Bráulio Tavares, publicada no Jornal da Paraíba no dia 3 de dezembro, versa sobre um dos assuntos que mais me fascina e que sempre me fascinou: o hábito de escrever. Eu sempre escrevi, independentemente de qualquer obrigação escolar e profissional, e daí a minha identificação com o artigo.
Por exemplo, meus pais guardam poemas e textos livres que escrevi aos sete, aos oito, aos nove anos de idade, e assim por diante. Ou seja, é possível dizer que eu escrevo desde que escrevo. Esse costume eu levei para a minha adolescência e carrego comigo até hoje.
Com isso, não estou querendo dizer que escrevo bem, mas apenas que escrevo com certa frequência. Escrever para mim é um hábito tão natural quanto beber, comer, dormir ou sonhar.
É o meio que uso para me comunicar com o mundo, e para compreender melhor a mim mesmo. Depois tornarei a escrever sobre isso. Por ora, quero mandar meu abraço a Agassiz Almeida Filho e Alexandre Salema, escritores compulsivos e disciplinados. Eis o texto de Bráulio:
A obrigação de escrever
Já me referi aqui, na coluna “Ou escreve ou endoidece” (em meu blog: http://tinyurl.com/y8stn4f), ao melhor conselho literário já proferido por Gabriel Garcia Márquez, e que consiste em: “Ficar trancado durante seis horas numa sala onde existe apenas material para escrever, mais nada”. Porque a grande verdade é que quem escreve, mesmo quando diz que ama o seu ofício, usa de todas as desculpas possíveis para não escrever: responder emails, ver se alguém curtiu seu post no Facebook, ler os jornais de hoje, ler os jornais de ontem... Sem falar na quantidade enorme de tarefas domésticas cuja urgência só se revela ao escritor no momento em que ele abre o Word: jogar fora os jornais velhos, guardar as camisas espalhadas pelos encostos de cadeira, apagar telefones inúteis na agenda do celular...
O mesmo conselho é dado por Raymond Chandler, com uma justificativa psicológica que não passa em branco. Diz ele, numa carta a Alex Barris, em 18 de março de 1949: “A coisa mais importante é que deve haver um espaço de tempo, digamos, de quatro horas por dia, pelo menos, em que um escritor profissional não pode fazer outra coisa senão escrever. Ele não é obrigado a escrever, e se não estiver com vontade, não precisa nem tentar. Ele pode olhar pela janela, ou plantar bananeira, ou se espojar no chão. Mas não pode fazer qualquer outra coisa produtiva, seja ler, escrever cartas, folhear revistas, preencher cheques. Ou escreve ou nada. É o mesmo princípio de manter disciplina nas escolas. Se você faz com que os estudantes fiquem bem comportados, eles vão acabar aprendendo alguma coisa da aula só para não morrer de tédio. Eu acho que este método funciona. Duas regras muito simples: a) você não é obrigado a escrever; b) você não pode fazer outra coisa. O resto vem por si só.”
Escrever criativamente requer uma energia mental que não se pode produzir com uma mera decisão da vontade. É algo parecido com tirar um automóvel do lugar: sempre que a gente liga o motor é preciso “passar primeira”, ou seja, engatar uma marcha poderosa, capaz de arrancar da imobilidade aquele monstrengo de ferro-velho, colocá-lo em movimento. Depois que ele já está em movimento, aí é moleza, passa-se uma marcha mais leve, depois outra... Mas a primeira tem que ser uma marcha forte.
Minha irmã Clotilde me deu outro conselho precioso: começar a escrever uma bobagem, como se estivesse se dirigindo a alguém, sem o menor compromisso. A gente logo descobre que daí a 20 ou 30 linhas já engatou o juízo num assunto qualquer e começa a desenvolvê-lo de maneira interessante. Aí é só “passar segunda” e seguir em frente; quando termina, a gente volta ao começo e apaga aquelas 20 ou 30 linhas de bobagens. Para escrever, o mais necessário é colocar-se no estado de tensão (quase digo “tesão”) indispensável ao processo: um estado emocional e intelectual de excitação, de envolvimento, de realização de possibilidades concretas. O resto é consequência.
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