Eis, logo abaixo, uma interessante entrevista a respeito do Direito Ambiental que o professor Celso Antônio Pachêco Fiorillo, inquestionavelmente um dos maiores estudiosos do assunto no país, concedeu à Revista Ecológico, de Minas Gerais. É possível destacar o papel de vilão ambiental que o jurista atribui à União, aos Estados e aos Municípios na questão ambiental, pois o Poder Público é, de longe, o maior degradador do país.
O Evangelho ambiental segundo Fiorillo
Especialista considerado a “Gisele Bündchen”do Direito Ambiental brasileiro confirma o tripé “Ministério Público feroz, empresário aterrorizado e advogado feliz”
Luciana Morais - redacao@revistaecologico.com.br
Preparando o terreno para o II Congresso Internacional de Direito Ambiental que acontecerá em Belo Horizonte, em setembro, numa promoção da OAB/MG, em co-realização com a Revista ECOLÓGICO, o advogado e professor Celso Fiorillo – considerado por alguns de seus pares a Gisele Bündchen do Direito Ambiental brasileiro – ministrou palestra em seu auditório, em BH, com o tema “O Direito Ambiental e o Poder Judiciário”. Autor de vários livros, doutor e mestre em Direito das Relações Sociais pela PUC/SP, Fiorillo se auto-intitula um evangélico-constitucional e diz que 95% de tudo o que interessa nesse ramo específico e em crescente evolução no Direito está na Constituição. E se sustenta hoje num tripé: “Ministério Público feroz, empresário aterrorizado e advogado feliz”. Acompanhe, nas páginas seguintes, as ideias desse advogado para quem a questão ambiental não se esgota nos problemas relacionados à fauna e flora. Pelo contrário. Abrange temas como saneamento, saúde, patrimônio cultural e até a regulação das torcidas organizadas, como já ocorre em São Paulo.
CONSTITUIÇÃO É A BASE
“O começo, meio e fim do Direito Ambiental estão na Constituição. 95% do que interessa em matéria ambiental está ali. Dizer que ele depende de regramento intraconstitucional, depende – o que é pior – de resoluções e portarias, é não compreender o que significa o Brasil na democracia. Isso facilita muito a visão teórica e prática do que é o Direito Ambiental brasileiro. Não sou partidário de um Direito alternativo. Em matéria ambiental, sempre tive uma posição muito clara, tanto do ponto de vista do que escrevo, quanto das ideias que desenvolvo. Sou um pregador, tenho uma visão de evangélico-constitucional. O que tenho feito, ao longo de toda a minha vida, é pregar esse livrinho (a Constituição) como sendo a única forma, o único caminho e a única vertente possível de se interpretar o Direito Ambiental brasileiro. Do ponto de vista do direito positivo brasileiro, a resposta do que é Direito Ambiental está no Artigo 225 da Constituição, que traz as estruturas fundamentais para entendermos que significa a relação jurídico-ambiental, conhecer deveres e direitos.”
DEFESA DO DIREITO POSITIVO
“Uma interpretação razoável do Direito Ambiental só é possível com base na Constituição e deve ter como foco os princípios fundamentais dela. Nela todos têm direito a um meio ambiente ecologicamente equilibrado, um Direito orientado para aquilo que tecnicamente chamamos de desenvolvimento sustentável – que nada mais é que a busca do equilíbrio. Basta ler os Artigos 1º e 3º. Com base neles, fica clara a noção jurídica de desenvolvimento sustentável. Ser sustentável é uma que está na moda.
Hoje, todo mundo diz que é sustentável: tem namoro sustentável, casamento sustentável, economia sustentável. Da mesma forma que citar transgênico pega mal, dizer que é sustentável pega bem. Mas como nossa base é o direito positivo, não podemos ficar na superfície. No plano constitucional, o conceito de meio ambiente é a tutela jurídica da vida. A pessoa humana é o seu parâmetro de interpretação. E não o fungo, não a fauna, a flora e, muito menos, o micróbio. O primeiro parâmetro definidor, no plano constitucional, é a dignidade da pessoa humana.”
ABRANGÊNCIA
“O Direito Ambiental não se esgota apenas nos problemas que envolvem flora, fauna, os rios. Saneamento, meio ambiente do trabalho, saúde e até mesmo questões ligadas ao patrimônio cultural – que aqui em Minas são muito fortes – também são típicos dele. São questões que, a partir de 1988, passaram a ser entendidas, pela Constituição, como assuntos que envolvem o Direito Ambiental. Isso ampliou, muitíssimo, a possibilidade de interpretação do direito, uma perspectiva importante que leva em conta as necessidades da pessoa.”
BEM AMBIENTAL
“Bem ambiental é todo bem considerado essencial à sadia qualidade de vida. Pressupõe valores centrais e necessários à sobrevivência humana. Assim, bem ambiental é um bem de uso comum do povo, não um bem de uso, gozo, fruição e destruição. Se o Direito Ambiental brasileiro tem essência na tutela da vida, é preciso salvaguardar tudo que o diz à pessoa – como saúde, educação, lazer e saneamento – valores que contribuem para que tenhamos um Direito Ambiental tipicamente brasileiro, expressão que costumo chamar de piso vital mínimo. Infinitamente mais importante que o ‘direito’ ambiental é o ‘dever’ – não só do estado organizado, do erário, mas de toda a sociedade – de preservar e defender os bens ambientais. E por quê? Porque sob a ótica da nossa tradição cultural judaíco-cristã, a vida tem valor. Por isso, somos obrigados a protegê-la, a preservá-la.”
OS VILÕES
“Hoje, os grandes vilões em matéria ambiental são União, Estados e Municípios. Eles são absolutamente campeões, como réus, em ações ambientais. Por incrível que pareça, combate que tem quer ser feito efetivamente é contra aqueles que, em tese, não deveriam ser combatidos, mas, sim, defender a população. O projeto dos partidos políticos transformados em Município, Estado e União não é um projeto de bem comum: é um projeto de poder. Por isso, eles são réus na maioria esmagadora das ações ambientais. Pensam que estão fazendo o bem e não estão. Por isso, não adianta termos eleições, governantes que se dizem populares, se os órgãos públicos acabam tendo uma postura policialesca (no mau sentido). O Estado deveria adotar uma postura preventiva, destinada a educar. Deveria dar o exemplo, mas o que se vê, infelizmente, é que aquele que deveria, teoricamente, tutelar os bens ambientais em proveito da coletividade não se posiciona nesse sentido.”
LÓGICA CAPITALISTA
“Do ponto de vista constitucional, tão importante quanto a dignidade da pessoa humana é a ordem jurídica do capitalismo. Está na Constituição, no Artigo 1º IV. Por isso, pergunto: ‘O que é mais importante do ponto de vista constitucional? A economia capitalista ou a dignidade humana?’. Resposta: as duas. Lucro é direito do empreendedor. Com ou sem maquiagem o que ele quer é lucro. Sem empreendimento não existe tributo e, sem tributo, não existe Estado, o erário. A função do empreendedor em matéria de bem ambiental é usá-lo em proveito do lucro. Onde está a inconstitucionalidade e a ilegalidade disso? É dessa dualidade entre a lógica do empreendedor e o respeito à dignidade da pessoa humana que surge o choque. Porque, pela lógica humana, todos querem ser felizes, não precisamos ler Aristóteles para entender isso. No entanto, felicidade nem sempre rima com lucro. E, em relação ao lucro, poucos são felizes. Basta olharmos o PIB brasileiro. A questão central é que a forma como empreendedor usa o bem ambiental quase nunca condiz com o que é pretendido pela população. Por isso, é impossível Direito Ambiental sem judicialização.”
SENSIBILIDADE
“O caminho do Direito Ambiental no século XXI passa pelo Poder Judiciário. Ao contrário de muitos colegas, não tenho uma visão ruim da Justiça. Sou advogado militante e venho notando que, aos pouquinhos, estamos ganhando terreno na busca de um maior equilíbrio. Mais que técnica, ciência e teoria, os grandes intérpretes do Direito Ambiental são as pessoas que têm maior sensibilidade.”
COMPORTAMENTO DAS EMPRESAS
“Só advogo para empreendedores e tenho notado que o setor empresarial vem se adequando à busca do equilíbrio ambiental. Tanto pela nova consciência ambiental que temos no país e que interessa às empresas – pois gera lucro e elas querem se apresentar cada vez mais ao consumidor como um segmento que protege o meio ambiente – quanto pela intervenção que vem sendo muito bem feita pelo Ministério Público, nas esferas estadual e federal, e também pelo Poder Judiciário, no sentido de coibir algumas atividades. O Ministério Público (MP) precisa e deve atuar. Sempre advoguei para empresas e digo que 80% das minhas causas resolvo com o MP.”
AUDIÊNCIAS PÚBLICAS
“Na perspectiva prática, não adianta estudar, fazer teoria, articular temas dos mais variados, muitas vezes importando uma visão cultural que não tem absolutamente nada a ver com o Brasil. A Constituição é um produto cultural. Não é preciso citar outros países, importar modelos. O Artigo 3º da Constituição pressupõe um Direito Ambiental real e que diz respeito a uma Belo Horizonte que não tem nada a ver com Berlim. Diz respeito a situações que envolvem Ouro Preto que nada têm a ver com Barcelona. A verdadeira discussão do Direito Ambiental é local. Daí a importância de realização de audiências públicas. Muitos dizem que dá muito trabalho, que o processo lento, mas respondo que democracia é assim mesmo. Quer algo mais rápido? A ditadura é rápida. Democracia demora e dá trabalho.”
DIVERSIDADE CULTURAL
“Quando falam em Direito Ambiental muitos pensam que vivemos na Noruega, na Suécia. Vemos trabalhos acadêmicos que citam a Alemanha, Portugal. São realidades completamente diferentes, não dá para comparar. Uma coisa é o Tribunal de Justiça de Minas ter uma interpretação sobre um tema ambiental e, o do Pará, outra. É para ter mesmo. O Brasil é uma potência mundial em matéria ambiental, devido à sua diversidade e biodiversidade. É dessa diversidade ambiental e cultural tipicamente nossa que o Poder Judiciário tem de tratar. Mas não temos como exigir que, da noite para o dia, ele tenha condição de julgar todos os casos. Hoje, infelizmente, ainda há despreparo na interpretação do Direito Ambiental. Tanto por parte de alguns jovens juizes quanto de muitos advogados.”
O EXEMPLO DE SÃO PAULO
“Um dos bons exemplos que temos no país é a iniciativa do Tribunal de Justiça de São Paulo, que tem uma Câmara Especial do Meio Ambiente, composta por oito desembargadores com interesse no tema e, sem prejuízo da atuação no direito publico, julgam questões ambientais a cada 15 dias, dando homogeneidade à matéria e produzindo acordos dos mais variados. A câmara julga até meio ambiente cultural. Sou advogado da Federação Paulista de Futebol e estou discutindo, há um ano, a tutela de 72 torcidas organizadas. Não para dissolvê-las, mas para buscar uma ordenação. Mas por que futebol? Muitos perguntam. Porque futebol, novela e carnaval são os três produtos culturais mais importantes do Brasil. E, portanto, típica matéria ambiental. Essa visão é, sem dúvida, um avanço.”
Perfil do Professor Fiorillo
Graduado em Direito pela PUC/SP, em 1982, Celso Fiorillo é doutor e mestre em Direito das Relações Sociais pela PUC/SP e primeiro professor livre docente em Direito Ambiental do Brasil. Atualmente, é assessor científico da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo, parecerista do Centro de Estudos Judiciários do Conselho da Justiça Federal, professor efetivo da Escola de Magistratura do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, professor da Escola Nacional de Formação e Aperfeiçoamento de Magistrados (Enfam) e professor do programa de Pós-graduação (doutorado/mestrado) da Universidade Metropolitana de Santos (Unimes). É, ainda, titular da Academia Paulista de Direito.
O Evangelho ambiental segundo Fiorillo
Especialista considerado a “Gisele Bündchen”do Direito Ambiental brasileiro confirma o tripé “Ministério Público feroz, empresário aterrorizado e advogado feliz”
Luciana Morais - redacao@revistaecologico.com.br
Preparando o terreno para o II Congresso Internacional de Direito Ambiental que acontecerá em Belo Horizonte, em setembro, numa promoção da OAB/MG, em co-realização com a Revista ECOLÓGICO, o advogado e professor Celso Fiorillo – considerado por alguns de seus pares a Gisele Bündchen do Direito Ambiental brasileiro – ministrou palestra em seu auditório, em BH, com o tema “O Direito Ambiental e o Poder Judiciário”. Autor de vários livros, doutor e mestre em Direito das Relações Sociais pela PUC/SP, Fiorillo se auto-intitula um evangélico-constitucional e diz que 95% de tudo o que interessa nesse ramo específico e em crescente evolução no Direito está na Constituição. E se sustenta hoje num tripé: “Ministério Público feroz, empresário aterrorizado e advogado feliz”. Acompanhe, nas páginas seguintes, as ideias desse advogado para quem a questão ambiental não se esgota nos problemas relacionados à fauna e flora. Pelo contrário. Abrange temas como saneamento, saúde, patrimônio cultural e até a regulação das torcidas organizadas, como já ocorre em São Paulo.
CONSTITUIÇÃO É A BASE
“O começo, meio e fim do Direito Ambiental estão na Constituição. 95% do que interessa em matéria ambiental está ali. Dizer que ele depende de regramento intraconstitucional, depende – o que é pior – de resoluções e portarias, é não compreender o que significa o Brasil na democracia. Isso facilita muito a visão teórica e prática do que é o Direito Ambiental brasileiro. Não sou partidário de um Direito alternativo. Em matéria ambiental, sempre tive uma posição muito clara, tanto do ponto de vista do que escrevo, quanto das ideias que desenvolvo. Sou um pregador, tenho uma visão de evangélico-constitucional. O que tenho feito, ao longo de toda a minha vida, é pregar esse livrinho (a Constituição) como sendo a única forma, o único caminho e a única vertente possível de se interpretar o Direito Ambiental brasileiro. Do ponto de vista do direito positivo brasileiro, a resposta do que é Direito Ambiental está no Artigo 225 da Constituição, que traz as estruturas fundamentais para entendermos que significa a relação jurídico-ambiental, conhecer deveres e direitos.”
DEFESA DO DIREITO POSITIVO
“Uma interpretação razoável do Direito Ambiental só é possível com base na Constituição e deve ter como foco os princípios fundamentais dela. Nela todos têm direito a um meio ambiente ecologicamente equilibrado, um Direito orientado para aquilo que tecnicamente chamamos de desenvolvimento sustentável – que nada mais é que a busca do equilíbrio. Basta ler os Artigos 1º e 3º. Com base neles, fica clara a noção jurídica de desenvolvimento sustentável. Ser sustentável é uma que está na moda.
Hoje, todo mundo diz que é sustentável: tem namoro sustentável, casamento sustentável, economia sustentável. Da mesma forma que citar transgênico pega mal, dizer que é sustentável pega bem. Mas como nossa base é o direito positivo, não podemos ficar na superfície. No plano constitucional, o conceito de meio ambiente é a tutela jurídica da vida. A pessoa humana é o seu parâmetro de interpretação. E não o fungo, não a fauna, a flora e, muito menos, o micróbio. O primeiro parâmetro definidor, no plano constitucional, é a dignidade da pessoa humana.”
ABRANGÊNCIA
“O Direito Ambiental não se esgota apenas nos problemas que envolvem flora, fauna, os rios. Saneamento, meio ambiente do trabalho, saúde e até mesmo questões ligadas ao patrimônio cultural – que aqui em Minas são muito fortes – também são típicos dele. São questões que, a partir de 1988, passaram a ser entendidas, pela Constituição, como assuntos que envolvem o Direito Ambiental. Isso ampliou, muitíssimo, a possibilidade de interpretação do direito, uma perspectiva importante que leva em conta as necessidades da pessoa.”
BEM AMBIENTAL
“Bem ambiental é todo bem considerado essencial à sadia qualidade de vida. Pressupõe valores centrais e necessários à sobrevivência humana. Assim, bem ambiental é um bem de uso comum do povo, não um bem de uso, gozo, fruição e destruição. Se o Direito Ambiental brasileiro tem essência na tutela da vida, é preciso salvaguardar tudo que o diz à pessoa – como saúde, educação, lazer e saneamento – valores que contribuem para que tenhamos um Direito Ambiental tipicamente brasileiro, expressão que costumo chamar de piso vital mínimo. Infinitamente mais importante que o ‘direito’ ambiental é o ‘dever’ – não só do estado organizado, do erário, mas de toda a sociedade – de preservar e defender os bens ambientais. E por quê? Porque sob a ótica da nossa tradição cultural judaíco-cristã, a vida tem valor. Por isso, somos obrigados a protegê-la, a preservá-la.”
OS VILÕES
“Hoje, os grandes vilões em matéria ambiental são União, Estados e Municípios. Eles são absolutamente campeões, como réus, em ações ambientais. Por incrível que pareça, combate que tem quer ser feito efetivamente é contra aqueles que, em tese, não deveriam ser combatidos, mas, sim, defender a população. O projeto dos partidos políticos transformados em Município, Estado e União não é um projeto de bem comum: é um projeto de poder. Por isso, eles são réus na maioria esmagadora das ações ambientais. Pensam que estão fazendo o bem e não estão. Por isso, não adianta termos eleições, governantes que se dizem populares, se os órgãos públicos acabam tendo uma postura policialesca (no mau sentido). O Estado deveria adotar uma postura preventiva, destinada a educar. Deveria dar o exemplo, mas o que se vê, infelizmente, é que aquele que deveria, teoricamente, tutelar os bens ambientais em proveito da coletividade não se posiciona nesse sentido.”
LÓGICA CAPITALISTA
“Do ponto de vista constitucional, tão importante quanto a dignidade da pessoa humana é a ordem jurídica do capitalismo. Está na Constituição, no Artigo 1º IV. Por isso, pergunto: ‘O que é mais importante do ponto de vista constitucional? A economia capitalista ou a dignidade humana?’. Resposta: as duas. Lucro é direito do empreendedor. Com ou sem maquiagem o que ele quer é lucro. Sem empreendimento não existe tributo e, sem tributo, não existe Estado, o erário. A função do empreendedor em matéria de bem ambiental é usá-lo em proveito do lucro. Onde está a inconstitucionalidade e a ilegalidade disso? É dessa dualidade entre a lógica do empreendedor e o respeito à dignidade da pessoa humana que surge o choque. Porque, pela lógica humana, todos querem ser felizes, não precisamos ler Aristóteles para entender isso. No entanto, felicidade nem sempre rima com lucro. E, em relação ao lucro, poucos são felizes. Basta olharmos o PIB brasileiro. A questão central é que a forma como empreendedor usa o bem ambiental quase nunca condiz com o que é pretendido pela população. Por isso, é impossível Direito Ambiental sem judicialização.”
SENSIBILIDADE
“O caminho do Direito Ambiental no século XXI passa pelo Poder Judiciário. Ao contrário de muitos colegas, não tenho uma visão ruim da Justiça. Sou advogado militante e venho notando que, aos pouquinhos, estamos ganhando terreno na busca de um maior equilíbrio. Mais que técnica, ciência e teoria, os grandes intérpretes do Direito Ambiental são as pessoas que têm maior sensibilidade.”
COMPORTAMENTO DAS EMPRESAS
“Só advogo para empreendedores e tenho notado que o setor empresarial vem se adequando à busca do equilíbrio ambiental. Tanto pela nova consciência ambiental que temos no país e que interessa às empresas – pois gera lucro e elas querem se apresentar cada vez mais ao consumidor como um segmento que protege o meio ambiente – quanto pela intervenção que vem sendo muito bem feita pelo Ministério Público, nas esferas estadual e federal, e também pelo Poder Judiciário, no sentido de coibir algumas atividades. O Ministério Público (MP) precisa e deve atuar. Sempre advoguei para empresas e digo que 80% das minhas causas resolvo com o MP.”
AUDIÊNCIAS PÚBLICAS
“Na perspectiva prática, não adianta estudar, fazer teoria, articular temas dos mais variados, muitas vezes importando uma visão cultural que não tem absolutamente nada a ver com o Brasil. A Constituição é um produto cultural. Não é preciso citar outros países, importar modelos. O Artigo 3º da Constituição pressupõe um Direito Ambiental real e que diz respeito a uma Belo Horizonte que não tem nada a ver com Berlim. Diz respeito a situações que envolvem Ouro Preto que nada têm a ver com Barcelona. A verdadeira discussão do Direito Ambiental é local. Daí a importância de realização de audiências públicas. Muitos dizem que dá muito trabalho, que o processo lento, mas respondo que democracia é assim mesmo. Quer algo mais rápido? A ditadura é rápida. Democracia demora e dá trabalho.”
DIVERSIDADE CULTURAL
“Quando falam em Direito Ambiental muitos pensam que vivemos na Noruega, na Suécia. Vemos trabalhos acadêmicos que citam a Alemanha, Portugal. São realidades completamente diferentes, não dá para comparar. Uma coisa é o Tribunal de Justiça de Minas ter uma interpretação sobre um tema ambiental e, o do Pará, outra. É para ter mesmo. O Brasil é uma potência mundial em matéria ambiental, devido à sua diversidade e biodiversidade. É dessa diversidade ambiental e cultural tipicamente nossa que o Poder Judiciário tem de tratar. Mas não temos como exigir que, da noite para o dia, ele tenha condição de julgar todos os casos. Hoje, infelizmente, ainda há despreparo na interpretação do Direito Ambiental. Tanto por parte de alguns jovens juizes quanto de muitos advogados.”
O EXEMPLO DE SÃO PAULO
“Um dos bons exemplos que temos no país é a iniciativa do Tribunal de Justiça de São Paulo, que tem uma Câmara Especial do Meio Ambiente, composta por oito desembargadores com interesse no tema e, sem prejuízo da atuação no direito publico, julgam questões ambientais a cada 15 dias, dando homogeneidade à matéria e produzindo acordos dos mais variados. A câmara julga até meio ambiente cultural. Sou advogado da Federação Paulista de Futebol e estou discutindo, há um ano, a tutela de 72 torcidas organizadas. Não para dissolvê-las, mas para buscar uma ordenação. Mas por que futebol? Muitos perguntam. Porque futebol, novela e carnaval são os três produtos culturais mais importantes do Brasil. E, portanto, típica matéria ambiental. Essa visão é, sem dúvida, um avanço.”
Perfil do Professor Fiorillo
Graduado em Direito pela PUC/SP, em 1982, Celso Fiorillo é doutor e mestre em Direito das Relações Sociais pela PUC/SP e primeiro professor livre docente em Direito Ambiental do Brasil. Atualmente, é assessor científico da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo, parecerista do Centro de Estudos Judiciários do Conselho da Justiça Federal, professor efetivo da Escola de Magistratura do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, professor da Escola Nacional de Formação e Aperfeiçoamento de Magistrados (Enfam) e professor do programa de Pós-graduação (doutorado/mestrado) da Universidade Metropolitana de Santos (Unimes). É, ainda, titular da Academia Paulista de Direito.