sábado, 25 de abril de 2009

Entrevista: Talden Farias - Licenciamento Ambiental

ENTREVISTA COM O ADVOGADO TALDEN FARIAS SOBRE O LICENCIAMENTO AMBIENTAL

Sobre o entrevistado:

Advogado, consultor jurídico e professor universitário, Talden Farias é considerado um dos maiores estudiosos do licenciamento ambiental na atualidade.

É autor da obra “Licenciamento ambiental: aspectos teóricos e práticos” (Editora Fórum, 2007), cujo prefácio é do jurista e professor Paulo Affonso Leme Machado e apresentação do advogado e professor Leandro Eustáquio de Matos Monteiro.

Recentemente publicou também “Introdução ao direito ambiental” (Editora Del Rey, 2009), um livro didático destinado especialmente ao estudante de graduação em Direito bem como a todos os profissionais da área jurídica ou não que pretenderem se iniciar no assunto.

Cursou mestrado em Ciências Jurídicas pela Universidade Federal da Paraíba (UFPB) e é doutorando em Recursos Naturais pela Universidade Federal de Campina Grande (UFCG), onde desenvolve uma pesquisa sobre o licenciamento ambiental do petróleo e gás natural.

É membro do Conselho de Proteção Ambiental do Estado da Paraíba (COPAM) e foi Chefe da Assessoria Jurídica da Secretaria do Meio Ambiente da Prefeitura de João Pessoa (SEMAM/PMJP).

LE: O que é o licenciamento ambiental?

TALDEN: É o processo administrativo que tramita perante o órgão ambiental competente, seja em âmbito federal, estadual ou municipal, e que tem como objetivo a defesa do meio ambiente e da qualidade de vida da coletividade por meio do controle prévio das atividades efetiva ou potencialmente poluidoras. Em outras palavras, o intuito do licenciamento é auferir a viabilidade ambiental, apontando se e de que formas o empreendimento proposto poderá ou não se instalar e operar.

LE: Quando surgiu o licenciamento ambiental?

TALDEN: Nacionalmente, o licenciamento ambiental surge com a Lei n. 6.938/81, que o classificou como um dos instrumentos da Política Nacional do Meio Ambiente. Anteriormente a isso alguns Estados já faziam uso do mecanismo, como o Rio de Janeiro com o Decreto-lei n. 134/75 e São Paulo com a Lei n. 997/76. Essa é a origem do licenciamento ambiental propriamente dito no país, que nasceu sob a influência da lei nacional de proteção ambiental norte-americana (Nacional Environmental Protection Act) de 1969.

No entanto, se levarmos em conta que a licença ambiental é um ato administrativo concessivo em matéria ambiental, é possível concluir que a “lógica do licenciamento” é bastante antiga. Desde épocas outras o Poder Público exige “autorizações”, “concessões” ou “outorgas” para que o cidadão possa fazer uso de determinados recursos naturais.

O Regimento do Pau-Brasil, por exemplo, que é de 1605, proibia o corte dessa madeira de lei sem a autorização real. Em praticamente todos os ordenamentos jurídicos se pode identificar esses “antecedentes remotos” do licenciamento ambiental.

LE:Qual é a relevância constitucional do licenciamento ambiental?

TALDEN: A Constituição Federal faz duas referencias ao licenciamento ambiental no art. 225, sem contudo mencioná-lo de forma expressa. A primeira é no inciso IV do § 1º do citado dispositivo, que exige o Estudo Prévio de Impacto Ambiental no licenciamento das atividades significativamente poluidoras, e a segunda é no inciso V, que determina caber ao Poder Público “controlar a produção, a comercialização e o emprego de técnicas, métodos e substâncias que comportem risco para a vida, a qualidade de vida e o meio ambiente”.

O caput do dispositivo constitucional citado garante o direito fundamental ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, devendo tanto o Poder Público quanto a sociedade civil trabalhar nesse sentido. Sendo assim, o licenciamento ambiental deve ser compreendido como um mecanismo que visa a dar concretude a essa determinação constitucional.

LE: Quais são as atividades que devem ser licenciadas?

TALDEN:Segundo o art. 10 da Lei n. 6.938/81, estão sujeitos ao licenciamento ambiental todas as atividades efetiva ou potencialmente poluidoras. Isso implica dizer que qualquer atividade que cause ou que simplesmente possa causar algum impacto ambiental socialmente relevante deverá se submeter ao mecanismo.

Na prática, isso inclui assentamentos rurais, casas de show, condomínios, hotéis, indústrias, oficinas mecânicas, obras de infra-estrutura, panificadoras, pecuária, postos de revenda de combustível, projetos agrícolas, usinas nucleares etc. O Anexo da Resolução n. 237/97 do CONAMA elenca uma série de atividades sujeitas ao licenciamento, alem de outras resoluções que tratam de empreendimentos específicos.

Contudo, é importante ressaltar que no caso concreto a Administração Pública poderá exigi-lo mesmo sem haver a previsão da exigência em nenhum texto legal, devendo apenas comprovar que se trata de uma atividade efetiva ou potencialmente poluidora. Afinal de contas, a cada dia surgem novas atividades e novas tecnologias, não se devendo esperar a edição de uma norma para controlar o seu potencial poluidor.

LE: Por que o licenciamento ambiental é tão importante?

TALDEN: Em muitos trabalhos acadêmicos o licenciamento ambiental é apontado como o mais importante instrumento da Política Nacional do Meio Ambiente. Eu não apenas concordo, como também afirmo isso – só que o faço como uma certa ressalva, porque entendo que não existe hierarquia entre os instrumentos elencados na Lei n. 6.938/81.

Na prática, contudo, a atrofia dos demais instrumentos faz com que o licenciamento ambiental seja a arena onde são travados todos os embates da política ambiental. Por exemplo, é muito comum que os empreendimentos só sejam fiscalizados quando da obtenção ou da renovação da licença ambiental.

As avaliações de impacto ambiental, por sua vez, também só ocorrem nos licenciamentos, o que é um equívoco. Às vezes o zoneamento só é observado no ato de licenciar.

Por conta da falta de estrutura dos órgãos ambientais, o licenciamento termina sendo um mecanismo de integração e de conexão de todos os instrumentos da Política Nacional do Meio Ambiente. Isso enfraquece o instrumento, tornando-o mais permeável às influencias de ordem econômica e política.

LE:A quem cabe fazer o licenciamento ambiental?

TALDEN: O parágrafo único do art. 23 da Constituição Federal determina que uma lei complementar será editada disciplinando a atuação administrativa da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios. Enquanto isso não ocorre, prevalece a competência administrativa comum, nos termos do que determina o caput do dispositivo citado.

Essa competência comum é a causa da maioria dos conflitos que envolvem o licenciamento. Quando o empreendimento possui uma visibilidade ou um porte econômico maior, é comum os vários entes federativos reivindicarem o direito de licenciarem a atividade, configurando o conflito positivo de competência.

Todavia, como a maioria dos empreendimentos não possui tais atributos, a regra mesmo é os entes administrativos lutarem para não desempenhar o seu papel. Foi por conta dessa indefinição que a chamada “guerras dos órgãos ambientais” ocorreu e ainda está ocorrendo em diversos Estados.

Ou seja, o órgão ambiental estadual procura dificultar o licenciamento das obras de interesse de determinado Município quando os gestores forem adversários políticos, procurando também o órgão ambiental local dificultar as obras estaduais existentes no território municipal. O recomendável é que, na ausência da lei complementar, os órgãos ambientais procurem dialogar, se possível com a intervenção do Ministério Público Estadual e Federal, buscando dividir as atribuições de acordo com o princípio constitucional da predominância do interesse.

LE:Qual o papel dos Municípios no licenciamento ambiental?

TALDEN: Um dos grandes problemas do licenciamento ambiental é a falta de participação dos Municípios, que em regra não dispõem de uma estrutura mínima em termos de recursos humanos e materiais. No Norte e no Nordeste, por exemplo, com a exceção de um ou outro Município, somente as capitais estão habilitadas para desenvolvê-lo.

O problema é que a maior parte das atribuições licenciatórias são desenvolvidas pelos órgãos estaduais, que normalmente só conseguem atender a demanda da capital e de seu entorno. É possível afirmar que a maior parte das atividades licenciáveis simplesmente não está licenciada, e isso ocorre por conta da falta de estrutura da Administração Pública ambiental.

A inclusão dos Municípios é extremamente relevante, porque trará capilaridade à Política Nacional do Meio Ambiente. É especialmente no controle das atividades de menor potencial poluidor, como bares, igrejas, oficinas e padarias, que se destaca o papel dos entes municipais.

LE: O licenciamento ambiental causa entraves à economia, como chegou a afirmar o Presidente da República?

TALDEN:Se o licenciamento ambiental é o controle ambiental público exercido em cima das atividades econômicas efetiva ou potencialmente poluidoras, é evidente que poderá restringir de alguma forma os investimentos a serem feitos. São muitos os exemplos de empreendimentos ecologicamente inviáveis, que resultaram em prejuízo para os cofres públicos e para a qualidade ambiental.

O desenvolvimento a qualquer custo não interessa à sociedade, além de ser inconstitucional. É preciso lembrar que o laissez-faire ambiental não existe mais, e que o licenciamento é um instrumento que limita o direito de propriedade tendo em vista o interesse coletivo.

Contudo, ao invés de entrave, esse mecanismo deveria ser compreendido como uma garantia de estabilidade e de segurança para o empresariado. O prejuízo do empresário que não segue as normas ambientais é enorme, já que está sujeito a embargos, multas e processos judiciais, além do inevitável dano à imagem.

LE:Quais são os principais problemas do licenciamento ambiental?

TALDEN:Os principais problemas do licenciamento ambiental já foram mencionados ao longo desta entrevista: falta de estrutura dos órgãos ambientais, ingerência política e econômica, ausência da regulamentação da competência administrativa e divergência entre os órgãos ambientais.

LE: Que bibliografia você indica para o estudo do tema?

TALDEN: Afora o meu livro, que é intitulado “Licenciamento ambiental: aspectos teóricos e práticos” (Editora Fórum, 2007), eu indicaria as seguintes obras: “Introdução ao licenciamento e à legislação ambiental brasileira” (Editora Lumen Júris, 2004), de Antônio Inagê de Assis Oliveira, “Aspectos jurídicos do licenciamento ambiental” (Editora Forense Universitária, 2005), de Daniel Roberto Fink, Hamilton Alonso Júnior e Marcelo Dawalibi, e “Licenciamento ambiental” (Editora Impetus, 2007), de Curt Trennepohl e Terence Trennepohl. Aos que realmente pretenderem se aprofundar no assunto, eu recomendo a pesquisa documental em cima dos processos administrativos de licenciamento ambiental a ser feita nos próprios órgãos competentes, pois uma vivência prática mínima do assunto é fundamental.

Fonte: http://www.leandroeustaquio.com.br/noticias/abril/visualiza.php?id=352

quarta-feira, 22 de abril de 2009

"Em Defesa das Árvores" (Rubem Alves)


Estou reproduzindo agora a belíssima crônica de autoria do consagrado escritor e filósofo Rubem Alves. Inclusive, ao final do texto ele faz uma crítica à "dendrofobia" presente na obra de Oscar Niemayer:

Em Defesa das Árvores

Estava eu na sala de espera do meu médico trabalhando absorto no meu laptop para matar o tempo, os “oclinhos” de ver perto na frente dos olhos, ao longe tudo era um borrão quando, de repente, um borrão alto se colocou à minha frente, baixei os “oclinhos” para ver à distância: era um homem que conheci menino, de precoce vocação científica, posto que menino ainda, se comprazia em experimentos incendiários com gases mal cheirosos. Depois dos cumprimentos de praxe e sem mais delongas ele disse: “Rubem, escreva uma crônica em defesa das árvores.” Havia indignação em sua voz e ele relatou:

“Havia, no terreno do meu vizinho, um ipê maravilhoso, árvore muito velha, tronco grosso, que anualmente produzia uma floração cor-de-rosa, para espanto e felicidade de todos. Pois, sem maiores avisos, o tal vizinho cortou o ipê. Fiquei indignado e fui saber das razões do assassinato. Que mal lhe teria feita aquela árvore mansa? E ele me explicou que as raízes do velho ipê estavam rachando o seu muro de tijolos e argamassa. Um ipê que leva cinqüenta anos para crescer cortado por causa de um muro que se constrói num dia! Aí lhe perguntei: “Por que não me falou? Eu teria pago a reconstrução do seu muro…”

E concluiu: “Você escreve uma crônica?” Tive uma reação desanimada. Lembrei-me das palavras tristes do Vinícius no seu poema “O Haver”, em que fala da “sua inútil poesia”. Sinto assim, de vez em quando, que aquilo que escrevo é inútil. Os que têm poder nem lêem e se lêem não levam a sério. As razões que movem a política são as razões dos machados e das serras; não são as razões da beleza. Escrever, para quê? Para sensibilizar o vizinho que gosta mais de um muro que de um ipê? O que eu escrevesse só encontraria eco naqueles que amam mais os ipês que os muros. Mas, nesse caso minha escritura seria desnecessária. E para os que amam mais os muros que os ipês ela seria inútil. Aí me lembrei de um poema de Chuang-Tzu, escrito séculos antes de Cristo: “Eu sei que não terei sucesso. Tentar forçar os resultados somente aumentaria a confusão. Não será melhor desistir e parar de me esforçar? Mas, se eu não me esforçar, quem o fará?” As palavras do sábio foram uma repreensão ao meu desânimo. Comecei a pensar. Lembrei-me de fato semelhante acontecido na minha rua. Havia um ipê amarelo que florescia no mês de julho. O chão ficava dourado com suas flores. Mas a dona da casa em frente ao ipê e a sua incansável vassoura deram o nome de “sujeira” ao dourado das flores caídas.

E, um belo dia, a árvore amanheceu com um anel cortado na sua casca. As veias pelas quais sua seiva circulava haviam sido seccionadas durante a noite. O ipê morreu. A vassoura triunfou. Há pessoas cujas idéias nascem da vassoura. Visitando um amigo que mora num condomínio rico de Campinas alegrei-me vendo que ele era todo arborizado com magnólias. As flores das magnólias são quase insignificantes. Mas o perfume é maravilhoso. Quem respira o perfume de uma magnólia tem a alma tocada pelo divino. Aí o meu amigo apontou para uma casa do outro lado da rua. Lá não havia magnólias. E explicou: “A dona da casa disse que dava muito trabalho varrer as folhas que caíam no chão.” Agora mesmo, a um quarteirão de onde escrevo, havia três daquelas árvores que se chamam “Chapéu de Sol”, de folhas largas e sombra generosa. Pois a dona da casa mandou cortar todos os galhos das três, ficando só os toquinhos. Ficaram parecidas com cabides de pendurar chapéu. Mas as árvores não guardam rancor. Trataram de continuar a viver - e nos toquinhos surgiram brotos verdes, como um gesto de perdão. Percebendo que as árvores insistiam em viver, ela mandou que todos os brotos fossem arrancados.
Quando as serras da CPFL mutilaram as velhas paineiras da Orosimbo Maia, que todos amavam, houve uma onda de indignação que ocupou as manchetes do Correio Popular.


Pois um leitor escreveu aborrecido porque o jornal perdia tanto tempo com uma coisa sem importância como árvores. O prazer em cortar árvores, me parece, está ligado à volúpia do poder. Quem corta, tortura ou mata experimenta o prazer de exercer poder sobre o mais fraco. Mas acho que o prazer em cortar árvores está ligado a uma coisa mais sinistra. Suspeito que estejamos vivendo um momento de metamorfose da nossa condição humana. Até agora temos sido habitantes do mundo da vida. Nosso habitat é constituído por florestas, animais, rios e mares. Somos seres biológicos, corpos. Mas agora estamos mudando de casa. Estamos trocando nossa casa biológica por uma outra casa eletrônica.

Faz tempo fiz a travessia dos lagos andinos - cenários maravilhosos, entre lagos, vulcões e florestas - passando por Bariloche e terminando em Buenos Aires. Em Bariloche fiquei conhecendo um casal que fazia o mesmo percurso com dois filhos adolescentes. Fui reencontrá-los numa das ruas centrais de Buenos Aires. “Graças a Deus estamos aqui!”, me disse o marido. “Já não aguentávamos mais: só lagos, montanhas e árvores. Aqui, felizmente, temos os videogames.” Virei Hulk na mesma hora e lhe disse: “Tomaram a excursão errada. Seu destino era Las Vegas!” Mas eles nada mais fizeram que expressar de forma grosseira o que já ficou normal. Nenhum adolescente troca um vídeo game por jardinagem. Nos filmes de ficção científica do tipo “Guerra nas Estrelas” que emocionam milhões não há árvores: somente máquinas com inteligência eletrônica. Nossas inteligências estão cada vez mais ligadas aos vídeos e computadores e cada vez mais distantes da natureza. Há crianças que nunca viram uma galinha de verdade, nunca sentiram o cheiro de um pinheiro, nunca ouviram o canto do pintassilgo e não têm prazer em brincar com terra. Pensam que terra é sujeira. Não sabem que terra é vida. As nossas escolas - seria bom se elas ensinassem as crianças a amar as árvores. Chamar pelo nome e amar as paineiras, as sibipirunas, as magnólias, os pinheiros, as magueiras, as pitangueiras, os jequitibás, os ipês, as quaresmeiras… Aprendi na escola que os homens são uma forma de vida mais evoluída que as árvores. Estou brincando com a possibilidade do contrário: que as árvores sejam mais evoluídas que nós. Se assim não fosse por que haveriam as Escrituras Sagradas de comparar o homem feliz com uma árvore plantada junto a ribeiros de águas? Com o que concorda Alberto Caeiro: “Sejamos simples e calmos como os regatos e as árvores, e Deus amar-nos-á fazendo de nós belos como as árvores e os regatos…” Deus nos amará quando formos como as árvores!

Ninguém vai para o inferno. Os que não amam as árvores também vão para o céu. Mas, como todos sabem, o céu é o lugar onde se encontram as coisas que amamos. O lugar onde se encontram as coisas que não amamos é o inferno. Assim, para os que não amam as árvores, um lugar com bosques, florestas, flores e riachos seria o inferno. Eles não irão para o inferno de árvores. Irão para o seu céu sem árvores, pois é isso que eles amam.

Morarão numa cidade planejada pelo Niemeyer onde tudo será feito de concreto segundo formas geométricas perfeitas, em nada semelhantes às coisas vivas. Os prédios do Congresso Nacional, em Brasília, são uma metade de esfera voltada para cima e uma metade de esfera voltada para baixo, sem janelas. Na cidade planejada pelo Niemeyer as árvores não sujarão as calçadas com suas folhas e flores. As árvores serão de concreto, semelhantes aos cogumelos: uma esfera cortada pelo meio equilibrando-se sobre um cilindro. O bom disso é que não haverá despesas com jardineiros. E as donas de casa não precisarão varrer a calçada.

Rubem Alves

segunda-feira, 20 de abril de 2009

Dendrofobia e Aquecimento Urbano


O texto abaixo transcrito é da autoria da professora e pesquisadora Isabelle Meunier, do departamento de Engenheira Florestal da Universidade Federal Rural de Pernambuco, e aborda uma questão presente na maioria dos centros urbanos brasileiros: o descaso com a arborização.


Em pleno mês de abril, início das chuvas, Recife ferve a mais de 30ºC. Se esse calor já é efeito das mudanças climáticas globais, não sabemos. Mas é certo que a nossa dendrofobia tem contribuído, e muito, para vivermos em uma cidade de clima escaldante. Do grego dendron (árvore), essa doença social alastra-se rapidamente e tem efeitos colaterais devastadores.

A dendrofobia pode ser observada com freqüência cada vez maior, nos mais diferentes ambientes, mesmo naqueles onde se espera que a cultura e a educação espantem certos medos ancestrais. Algumas pessoas, mais irreverentes do que esta autora, desconfiam que, na verdade, os humanos temem as árvores por lembrar a “floresta ancestral”, aquela que abrigava nossos ascendentes simiescos. Temem esquecer a postura ereta e voltar a macaquear nos convidativos galhos das árvores!

Exemplos dendrofóbicos não faltam, infelizmente: o Colégio Marista São Luiz, detentor de uma área verde importante no outrora agradável e arborizado bairro das Graças, por motivos ignorados, vem cortando suas grandes árvores frontais, deixando um cenário de desolação onde antes havia sombra acolhedora. E não está só na iniciativa: segue o triste exemplo da Academia Pernambucana de Letras. Aliás, a reforma do jardim do belo solar da APL denuncia os rumos perigosos escolhemos para nossa cidade: uma placa anuncia que uma empresa de construção civil é a responsável pela reforma dos jardins, um engenheiro civil apresenta-se com seu responsável técnico e alguns montes de lajotas e blocos de cimento indicam qual a matéria-prima do “jardim”.

Há poucos dias, um enorme caminhão saiu da APL carregando toras do que antes eram frondosas mangueiras, imponentes castanholas, belos cajueiros e perfumadas aroeiras. Afinal, um jardim que é executado por uma empresa de construção, - um jardim de pedra e cal – não precisa de árvores, aliás, não tolera árvores e apenas permite estreitas e envergonhadas faixas de gramas e de plantinhas ornamentais de canteiro e forração.

A menos que tenha havido algum movimento revisionista na língua portuguesa, jardins e parques devem ser locais onde imperam os elementos naturais, não necessariamente “disciplinados” (disciplinar as árvores foi o argumento do presidente da APL, na imprensa, para autorizar as mutilações impostas às árvores...). Locais de solo não impermeabilizados, oportunidade de estar em contato com a natureza, mesmo que em fragmentos restritos e com elementos artificiais, os jardins e parques urbanos são elementos necessários à própria urbanização e à convivência civilizada e saudável nas cidades. Isso sem falar no embelezamento que trazem, com diferentes cores e formas de vida, na tão necessária amenização climática e na redução dos gastos com energia (já que, inexoravelmente, em uma cidade sem árvores e sem sombra, os condicionadores de ar são acionados por aqueles que podem adquiri-los e sustentá-los..)

Mas, apesar de tantos serviços ambientais, paisagísticos e socioculturais, uma fobia coletiva e inexplicável ameaça esses espaços. Hoje, evitam-se árvores porque elas são grandes. Vivemos em prédios de 40 andares, confiando cegamente nos cálculos estruturais que foram feitos para sustentá-los, mas tememos árvores altas, pois elas “podem cair” (!). Diante de um telhado sujo ou de uma calha entupida, a solução não é mais, como antes, limpá-los – mas cortar todas as árvores que contribuíram com suas folhas para essa situação. A boa e velha vassoura foi substituída pela motosserra porque, afinal, revestimentos cerâmicos e pisos intertravados não devem ser maculados pela folhas e flores de árvores. Vivemos em uma sociedade que não encontrou uma solução segura e eficiente para os resíduos que gera, mas que não tolera folhas no chão (embora tolere a presença de crianças intoxicadas por cola nos sinais de trânsito!). Somos prisioneiros da violência urbana (humana, antes de tudo), e nos vingamos nas árvores, responsabilizando-as pelos nossos temores (árvores abrigam ladrões, na opinião de uma moradora de Boa Viagem, ao solicitar a remoção de uma castanhola da sua calçada!). Projetamos espaços nos quais a maior atração é o concreto, revestindo o solo e erguendo estranhas formas que agridem o bom gosto e a paisagem, por trás das quais poucas árvores se esgueiram, e chamamos isso de “parque”.

Se eu fosse médica, tentaria a celebridade caracterizando essa doença que se agrava de forma fatal. Como cidadã, espero que algum um psiquiatra social se debruce sobre a dendrofobia e busque entender suas razões e, urgentemente, encontre uma cura. Pois sem isso, nossa vida em um grande centro urbano, sem árvores, sem jardins e sem parques, será algo realmente infernal.

quinta-feira, 2 de abril de 2009

Evento com o professor Paulo Affonso Leme Machado


Às 18 horas do dia 16 de abril o professor Paulo Affonso Leme Machado proferirá palestra intitulada “Tutela constitucional dos princípios ambientais” no auditório da Faculdade Salesiana, no Recife.

O endereço é Rua Dom Bosco, nº 551, bairro da Boa Vista, e o ponto de referência mais próximo é o Consulado Norte-Americano.

O evento é organizado pela Associação Pernambucana de Defesa do Meio Ambiente, a mais antiga e respeitada organização não governamental ambientalista pernambucana, em parceria com a Sapere Audi, uma instituição privada de ensino superior que promove uma especialização em Direito Ambiental.

Na ocasião, também será lançado a 17ª edição do seu livro “Direito Ambiental Brasileiro” (Editora Malheiros), considerado o mais completo estudo doutrinário sobre o tema em idioma português.

O professor Paulo Affonso é apontado como o maior nome do Direito Ambiental brasileiro.

Com efeito, o seu currículo na área é deveras extenso.

Promotor de Justiça aposentado pelo Estado de São Paulo, atualmente é professor titular da Universidade Metodista de Piracicaba.

Dentre os seus títulos acadêmicos, destaca-se o mestrado em Direito Ambiental pela Universidade de Estrasburgo, na França, o doutorado em Direito pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, o doutorado “honoris causa” pela Universidade Estadual Paulista e o pós-doutorado pela Universidade de Limonge, também na França.

Além de “Direito Ambiental Brasileiro”, publicou os livros “Recursos hídricos: direito brasileiro e direito internacional” (Editora Malheiros) e “Direito à informação e meio ambiente” (Editora Malheiros), “Estudos de Direito Ambiental” (Editora Malheiros) e “Ação civil pública: tombamento” (Editora Revista dos Tribunais) – afora os inúmeros capítulos de livro que escreveu.

Professor visitante da Universidade de Quebec, no Canadá, da Universidade de Milão, na Itália, da Universidade de Bucareste, na Romênia, da Universidade Internacional de Andaluzia, na Espanha, e das Universidades Lyon III, Córsega e Limoges, na França, além de pesquisador na Universidade de Louisiana, nos Estados Unidos.

É convidado para ministrar conferências e para participar de bancas de pós-graduação nas mais respeitadas universidades do planeta, a exemplo de Coimbra, Salamanca e Sorbonne.

Atuou como consultor da Organização das Nações Unidas para Agricultura e Alimentação e do Programa de Meio Ambiente de Organização das Nações Unidas, na África.

Foi o único brasileiro agraciado com o “Elizabeth Haub”, o grande prêmio internacional do Direito Ambiental, concedido pela Universidade de Bruxelas, na Bélgica.

Contudo, o professor Paulo Affonso é muito mais do que alguém que simplesmente leciona e escreve sobre Direito Ambiental.

Trata-se de uma pessoa que, em certo sentido, construiu a legislação e a própria política ambiental brasileira.

O primeiro livro sobre a matéria publicado no país é de autoria dele.

Quando a Secretaria Nacional do Meio Ambiente – o primeiro órgão propriamente ambiental brasileiro – foi criada em 1973, o professor assumiu a Procuradoria do órgão a convite do então recém nomeado secretário Paulo Nogueira Neto.

A Lei nº 6.938/81, que dispõe sobre a Política Nacional do Meio Ambiente e que até hoje é tida como a norma ambiental infraconstitucional mais importante, foi originalmente redigida por ele.

Essa é uma lei revolucionária, porque previu a responsabilidade objetiva em matéria ambiental, porque previu a responsabilidade das instituições bancárias públicas no financiamento de atividades poluidoras, porque previu um conselho público de direitos com poder decisório e participação da sociedade civil e porque previu pela primeira vez a possibilidade de o Ministério Público ingressar com uma ação coletiva em defesa do meio ambiente.

O professor colaborou com a Assembléia Constituinte de 1988, e vários dos muitos dispositivos constitucionais que versam sobre a questão ambiental são de redação dele.

Consta que ele foi o primeiro a usar e a defender a terminologia “Direito Ambiental” como a mais adequada, já que na década de setenta a expressão “Direito Ecológico” estava mais em voga.

Ou seja, é um dos raros juristas que batizou um ramo da Ciência Jurídica.

Por isso, atribuem a ele uma certa “paternidade” do Direito Ambiental brasileiro.

Mas a importância do professor Paulo Affonso Leme Machado não se resume a isso.

Na minha opinião, o seu legado mais importante é a forma ética como lida com a questão ambiental.

O Direito Ambiental para ele é uma missão, um sacerdócio mesmo.

É por isso que, mesmo cansado e idoso, ele continua a viajar pelo país e pelo mundo a proferir palestras e a distribuir os seus ensinamentos.

São mais de quarenta anos de carreira dedicados incansavelmente à defesa do meio ambiente e da qualidade de vida da coletividade, sem nunca se dobrar aos fortíssimos interesses econômicos e políticos que permeiam a área.

Com o jeito gentil de falar e de tratar as pessoas, o professor é exemplo como intelectual e como ser humano.

Eu poderia classificá-lo como “o advogado da Terra”, ou o “advogado do planeta”.

Nas causas mais importantes em que a proteção do meio ambiente está em jogo, o professor deixa o seu abrigo em Piracicaba e parte para os tribunais, como na ação civil publica assinada por ele e proposta pelo Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor que resultou na exigência de estudo prévio de impacto ambiental para o cultivo de organismos geneticamente modificados.

O intuito deste texto é convidar o amigo para participar desse evento que conta com tão ilustre presença.

Quem gosta de Direito Ambiental, ou quem simplesmente se interessa pelas questões ambientais, não pode perder a oportunidade de encontrar o nosso grande mestre.


(João Pessoa, 2 de abril de 2009)

quarta-feira, 1 de abril de 2009

No Congresso de Direito Ambiental do Planeta Verde - 2005

Essa fotografia registra um momento do Congresso Internacional de Direito Ambiental de 2005, que é organizado anualmente pelo Instituto o Direito por um Planeta Verde durante a semana do meio ambiente. No instante registrado pelo amigo Romero Moreira, conversávamos eu, Francisco Seráphico da Nóbrega Coutinho (magistrado e professor de Direito Ambiental no Rio Grande do Norte) e o jurista Édis Milaré (advogado e um dos maiores doutrinadores do Direito Ambiental do país).


Site


Não se preocupem: não serei candidato a nada. Essa fotografia foi tirada para o site que pretendo montar ainda neste ano, tomando como referência a home-page de colegas professores de Direito.