domingo, 15 de janeiro de 2012

A Morte e a Morte do Jacaré do Açude Velho

Campina Grande e a Paraíba ficaram estarrecidas com a notícia de que o lendário “jacaré do Açude Velho” faleceu. O corpo do réptil foi retirado das águas na tarde deste sábado, depois que populares o avistaram boiando. A partir daí, surgiram inúmeras matéria na imprensa, além dos muitos artigos e comentários que estão circulando pela internet. Existem até convites para o velório e o enterro. Na década de 1980 um dos assuntos mais discutidos na Rainha da Borborema era a existência ou não do animal. A cidade praticamente se dividia entre os que acreditavam e os que não acreditavam que o bicho estaria ali – seguindo a sempre apaixonada rivalidade que divide a cidade tanto no futebol quanto na política. Ao longo dos anos foram feitas inúmeras matérias jornalísticas sobre o tema, destacando o depoimento de pessoas que afirmavam ter visto o indivíduo e de pessoas que afirmavam que o mesmo não sobreviveria naquela ambiente. O mistério lembrava o caso do monstro do Lago Ness, legendária criatura pré-histórica que habitaria um lago nas terras altas escocesas, e que vez por outra seria visto pelos moradores da região. Na infância por diversas vezes eu cheguei a avistar um movimento estranho naquelas águas, e jurei para mim mesmo que se tratava mesmo do animal. Outra lembrança é que eu e meus amiguinhos brincávamos próximos ao balde do açude com receio de sermos repentinamente abocanhados, embora sempre ficássemos perto da borda. Alguns anos depois surgiram imagens do réptil, comprovando de forma definitiva a sua existência. Mais tarde ainda, eu tomei conhecimento de que não houve um, mas muitos jacarés no Açude Velho. Um ambientalista me contou que faz mais de trinta anos presenciou o instante em que vários desses bichos foram despejados naquelas águas contaminadas de uma única vez. Depois escutei relatos semelhantes de outras pessoas, ainda que relativos a épocas distintas. Com efeito, somente isso explica por que ocorreram tantos relatos e em períodos temporais tão distintos. Por essa razão, a despeito da lamentável morte do animal cujo corpo foi resgatado, é muito provável que ainda existam outros jacarés no açude, possivelmente até parentes do falecido. O “jacaré do Açude Velho” é uma verdadeira instituição campinense e paraibana, e certamente o falecimento desse indivíduo não esgotará a magia e o mistério que envolve o assunto, porque outros jacarés aparecerão e o mito continuará. Como escreveu o brilhante poeta José Antônio Assunção no poema “O acorrentado”, publicado no livro “O câncer no pêssego”: “Sabes desde o Cáucaso que o lamento perde o homem, quando perde o mito”. João Pessoa/PB, 14 de janeiro de 2012.

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