sábado, 20 de dezembro de 2008
Introdução ao Direito Ambiental
No início do próximo ano a Editora Del Rey deverá lançar o livro "Introdução ao Direito Ambiental", de minha autoria. O intuito do trabalho é iniciar o estudante de graduação e de pós-graduação no tema, bem como o profissional da área jurídica e os outros profissionais que também trabalhem com a questão ambiental (a exemplo de biólogos, ecólogos e engenheiros ambientais), a partir de uma abordagem didática e interdisciplinar.
Para a minha honra, o prefácio foi escrito pelo professor Agassiz Almeida Filho, um dos grandes constitucionalistas brasileiros conteporrâneos e autor do livro cuja capa está reproduzida nesta postagem. Além do mais, trata-se inquestionavelmente do texto mais bonito que já foi escrito sobre algum trabalho meu, e abaixo eu reproduzo a parte dele com a qual mais me identifico:
(...)
A crise ambiental como problema de cultura cidadã – Quando criança, tive um pássaro chamado Celestino. Era um azulão do Nordeste – passerina brissonii –, que comprei em uma loja de animais na feira livre de Campina Grande. Há um ano, soube que a ave está na relação das espécies ameaçadas de extinção. Por um momento, senti uma tristeza infantil, como se o passarinho azul que eu criava estivesse morto na sua gaiola, e eu, ainda menino, precisasse me aproximar da pequena prisão de palitos e encontrar o seu fim.
Era uma manhã de sábado de 1983. Estava tudo preparado. No dia anterior, passei na casa de Menininho e de Marco. Também combinei com Mita, que, naquela tarde de sexta-feira, matava aula para jogar bola perto da mercearia de Dona Lusimar. Saímos do Alto Branco, antes das sete da manhã. Éramos quatro garotos de bicicleta, que pretendiam cruzar parte da cidade para ir à feira e à loja de animais de Seu Basto. Pedalamos pela Avenida Canal, pegamos à direita ao chegar ao Açude Velho, e ali, vigiados de longe pelo prédio da Faculdade de Direito, jogamos as bicicletas no chão e entramos na loja. O pequeno comércio de Seu Basto era um verdadeiro paraíso para os meninos da minha época. Havia de tudo: azulão, canário-da-terra, jabuti, papagaio, preá, galo-de-campina e outros exemplares da nossa fauna.
Comprei um azulão. Voltei para casa com pressa para ele não sofrer com a viagem, já que o pássaro estava em um alçapão muito pequeno, amarrado ao banco da bicicleta. Finalmente o coloquei em uma gaiola nova, com um pote vazio de margarina fazendo as vezes de bebedouro. Fiquei esperando que ele cantasse, que começasse a comer, que voasse de um lado para outro, no ritmo alegre da passarada que eu criava naquele tempo. Não sabia que minha amizade com Celestino poderia contribuir para a extinção da sua espécie. Pouca gente sabia disso em 1983. Eram tantos os passarinhos na feira. Na zona rural, eles voavam por todos os lados. Quem poderia imaginar? Mas a espécie de Celestino pode se extinguir, e levar com ela parte da minha infância, do patrimônio natural da humanidade, do meio ambiente considerado como realidade autônoma, que tem valor em si. Também sou responsável por esse estado de coisas, porque responsáveis pelo meio ambiente somos todos nós que dele dependemos.
(...)
Praia de Intermares, 28 de setembro de 2008.
Agassiz Almeida Filho
Consultor Jurídico (www.agassizfilho.com)
Mestre em Ciências Jurídico-Políticas pela Universidade de Coimbra
Doutorando em Direito Constitucional pela Universidade de Salamanca
Coordenador do Núcleo de Estudos Jurídicos da Fundação Casa de José Américo
Professor Titular de Direito Constitucional da UEPB
Colaborador Permanente da Revista Latino-Americana de Estudos Constitucionais
Autor de livros e artigos jurídicos publicados no Brasil e no exterior
Observação: Quando criança eu comprei muitos animais silvestres nessa mesma loja, porque essa era uma prática comum naquela época entre as crianças de todas as classes sociais na minha cidade natal. Cheguei mesmo a criar na minha casa camaleões, coelhos, mocós, preás e até saguins, o que era estimulado pela minha família. É claro que eu não tinha noção do mau que essa prática, ainda hoje tão arraigada no país inteiro, representa para o equilíbrio ecológico e para a biodiversidade. Da mesma forma que Agassiz, eu contribuí para a lesão a essas espécies e ao meio ambiente acreditando estar fazendo algo saudável para os próprios animais.
Boneco de Desertificação
Esse engraçado "boneco de desertificação" foi enviado a mim pelo amigo Frederico Campos, engenheiro agrícola e estudioso das questões ambientais do semi-árido brasileiro. Além da óbvia e necessária referência ao problema da desertificação, é interessante fazer um contraponto entre essa imagem e a ridícula decoração natalina que toma conta das casas e da cidade.
Desde criança eu nunca consegui compreender o porquê da neve, dos fortes casacos de couro ou de lã e das renas nessa época do ano, em que na maior parte do tempo o calor é simplesmente insuportável. O pior é que isso cria um descompasso entre o imaginário coletivo e o nosso meio ambiente, levando a uma desvalorização dos ecossistemas e dos costumes locais.
Ainda em referência à minha infância, por conta da influência das revistas e dos filmes norte-americanos eu sentia falta das florestas temperadas, da neve e dos pinheiros naturais que deveriam servir como árvore de natal na sala de nossa casa. Eu não sabia que vivia entre dois ecossistemas muito mais ricos do que qualquer bioma estadunidense, que são a caatinga e a mata atlântica, nem que Jesus Cristo nasceu em uma vegetação muito próxima a do semi-árido nordestino.
domingo, 14 de dezembro de 2008
Anedota Búlgara
Embora esse seja um dos textos menos lembrados de Carlos Drummond de Andrade, eu confesso que sempre tive uma afeição especial por ele. Trata-se do poema "Anedota búlgara", publicado no livro "Alguma poesia" em 1930. A sensibilidade do poeta captou, em uma época em que não se discutia nada relacionado à ecologia, que determinados seres humanos se comportam realmente como predadores planetários.
Era uma vez um czar naturalista
que caçava homens.
Quando lhe disseram que também se caçam borboletas e andorinhas,
ficou muito espantado
e achou uma barbaridade.
terça-feira, 2 de dezembro de 2008
Direito Animal, Ecologia Profunda e Vegetarianismo
Faz várias semanas que eu enviei pela Internet a referência de um vídeo a respeito do vegetarianismo. O objetivo foi levantar essa discussão dentro de uma eminentemente perspectiva ecológica. Nesse e-mail, escrevi um pequeno e despretencioso intróito que, para a minha surpresa, foi reproduzido no blog do professor Paulo Róney Ávila Fagúndez, renomado jurista e escritor gaúcho radicado em Santa Catarina (http://pr.fagundez.zip.net/arch2008-11-02_2008-11-08.html). Eis o meu texto, incluindo o título dado pelo citado professor:
UMA VISÃO DE ECOLOGIA PROFUNDA
Dentro do Direito Ambiental existe uma segmentação a que se convencionou chamar 'Direito Animal', que se destaca pela defesa dos animais. Aqui no Brasil temos nos professores Edna Cardozo Dias (doutora em Direito pela UFMG e professora da PUC-MG) e Heron Santana (doutor em Direito pela UFPE e professor da UFBA, além de curador do meio ambiente de Salvador) as grandes referências do assunto. A propósito, não são tantos os estudiosos do Direito Ambiental a se interessar pelo assunto, talvez porque o apelo econômico não pareça tão significativo em um primeiro momento. Pois bem, o Direito Animal é um segmento jusambientalista influenciada pela ecologica profunda ou deep ecology, corrente filosófica segundo a qual a natureza possui um valor em si mesma e que por isso deve ser protegida, independentemente de valor econômico ou de qualquer outra ordem para o ser humano. Com isso, procura-se quebrar o paradigma antropocêntrico predominante na sociedade e, naturalmente, no Direito, ao estabelecer que o objeto da proteção das normas ambientais é a vida como um todo e não apenas a vida humana. A própria Constituição Federal de 1988 fez referência a isso ao vedar expressamente os maus-tratos aos animais, a despeito de qualquer relação que isso possa ter com as atividades humanas. A propósito, já existe uma pequena mas excelente bibliografia jurídica sobre o assunto, a exemplo do livro de Tiago Fensterseifer. Nesse diapasão, uma das bandeiras desse segmento jusambientalista é o abolicionismo animal, que é a luta contra o uso de animais não-humanos como propriedade ou recurso econômico. O crescimento dessa corrente em todo o mundo tem incentivado o vegetarianismo, que agora passa a ser uma opção política além de uma busca por mais saúde e qualidade de vida. Embora tenha sido vegetariano durante alguns anos de minha vida, especificamente de 1995 a 1998, confesso que naquela época eu nunca relacionei isso à defesa do meio ambiente. No entanto, diante do estágio de degradação do planeta, a questão volta à tona: por que não uma opção por uma alimentação que economiza água, energia, pastos e florestas, além da própria questão animal que também deve ser considerada? Na condição de ex-vegetariano, eu tenho consciência de que o movimento ambientalista também deve incorporar a vertente vegetariana, ainda que de forma moderada.
UMA VISÃO DE ECOLOGIA PROFUNDA
Dentro do Direito Ambiental existe uma segmentação a que se convencionou chamar 'Direito Animal', que se destaca pela defesa dos animais. Aqui no Brasil temos nos professores Edna Cardozo Dias (doutora em Direito pela UFMG e professora da PUC-MG) e Heron Santana (doutor em Direito pela UFPE e professor da UFBA, além de curador do meio ambiente de Salvador) as grandes referências do assunto. A propósito, não são tantos os estudiosos do Direito Ambiental a se interessar pelo assunto, talvez porque o apelo econômico não pareça tão significativo em um primeiro momento. Pois bem, o Direito Animal é um segmento jusambientalista influenciada pela ecologica profunda ou deep ecology, corrente filosófica segundo a qual a natureza possui um valor em si mesma e que por isso deve ser protegida, independentemente de valor econômico ou de qualquer outra ordem para o ser humano. Com isso, procura-se quebrar o paradigma antropocêntrico predominante na sociedade e, naturalmente, no Direito, ao estabelecer que o objeto da proteção das normas ambientais é a vida como um todo e não apenas a vida humana. A própria Constituição Federal de 1988 fez referência a isso ao vedar expressamente os maus-tratos aos animais, a despeito de qualquer relação que isso possa ter com as atividades humanas. A propósito, já existe uma pequena mas excelente bibliografia jurídica sobre o assunto, a exemplo do livro de Tiago Fensterseifer. Nesse diapasão, uma das bandeiras desse segmento jusambientalista é o abolicionismo animal, que é a luta contra o uso de animais não-humanos como propriedade ou recurso econômico. O crescimento dessa corrente em todo o mundo tem incentivado o vegetarianismo, que agora passa a ser uma opção política além de uma busca por mais saúde e qualidade de vida. Embora tenha sido vegetariano durante alguns anos de minha vida, especificamente de 1995 a 1998, confesso que naquela época eu nunca relacionei isso à defesa do meio ambiente. No entanto, diante do estágio de degradação do planeta, a questão volta à tona: por que não uma opção por uma alimentação que economiza água, energia, pastos e florestas, além da própria questão animal que também deve ser considerada? Na condição de ex-vegetariano, eu tenho consciência de que o movimento ambientalista também deve incorporar a vertente vegetariana, ainda que de forma moderada.
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